É difícil encontrar alguém que não seja interessado em HQs (história em quadrinhos), e de todos seus causos, que não tenha ouvido falar no nome de Todd McFarlane. E ainda mais que não tenha ouvido falar de pelo menos uma de suas “tretas” judiciais que esteja envolvido. Mas muito poucos, fora do círculo pessoal de McFarlane, sabem exatamente quantas batalhas judiciais e legais ele estava enfrentando quando a década de 90 acabou.

Praticamente todos os casos judiciais de McFarlane aconteceram por causa de situações criadas por ele mesmo. Para entender sobre este livro precisamos entender primeiro da história destas questões legais.

A primeira foi nomear um mafioso de sua histórias com o mesmo nome de um jogador de hóquei, Tony Twist. A segunda foi contratar Neil Gaiman para escrever uma de suas edições (Spawn #9). A terceira aconteceu quando o tio McFarlane decidiu comprar tudo que restava da então falida editora Eclipse Comics (incluindo no pacote o personagem Marvelman, ou como ficou conhecido nos EUA e no resto do mundo, Miracleman).

Na esquerda temos Tony Twist, o jogador de hóquei, em cima temos Spawn Medieval (que sofreu um reboot e hoje é outro personagem diferente), no meio temos a Ângela (que também hoje em dia é outra personagem e foi parar na Marvel), abaixo temos o Conde Nicholas Cogliostro (que hoje em dia voltou ao universo do Spawn sendo chamado apenas de Cog) e na direita temos o Marvelman/Miracleman da falida editora Eclipse, na qual McFarlane comprou a empresa, e foi daí por isso que se começou a “treta” com o escritor Neil Gaiman, pois ele também havia roteirizado histórias para este personagem na época da Eclipse, sucedido de um incrível arco de histórias escritas por Alan Moore.

A primeira decisão levou ao julgamento contra Tony Twist, as duas últimas escolhas levaram ao famoso caso contra Neil Gaiman, a respeito dos personagens que ele co-criou: Spawn Medieval, Ângela e Conde Cagliostro.

Ainda para “piorar o caso”, por causa dessa compra da Eclipse feita pelo McFarlane em 1996 (pela bagatela de $ 25.000 dólares), há o problema dos direitos autorais do personagem Miracleman que pertenciam a esta editora. O escritor britânico Neil Gaiman escreveu uma fase deste personagem no início da década de 90 junto com o roteirista Mark Buckingham (famoso por escrever algumas histórias de Sandman e Fábulas, pelo selo DC/Vertigo), vindo depois de um incrível fase desenvolvida por Alan Moore na década de 80 (e considerada até hoje uma obra prima da nona arte), histórias todas feitas até a falência da Eclipse Comics no meio dos anos 90. Gaiman só estava esperando Todd retornar sua parte dos direitos do Miracleman para si, mas a “chapa esquentou” quando Todd introduziu o nome “Mike Moran” (o alter ego do Miracleman) na edição #6 de Hellspawn sem avisar ninguém. A “cereja do bolo” foi quando uma versão moderna do personagem foi introduzida depois da edição #150 de Spawn, mas agora acabou se tornando “outro personagem”, usando o nome de Homem dos Milagres (que durante a Saga do Armagedom era também “chamado” de Mãe da Existência, por causa de uma brincadeira com o termo inglês, pois a sigla Man Of Miracle se torna MOM, ou “mãe” em português), e que também se tornou uma das mais raras action-figure produzida pela McFarlane Toys.

Acima vemos o nome “Mike Moran” escrito na última página de Hellspawn #6. Ele é o alter ego do personagem Miracleman… A primeira citação dele no universo de Spawn.
Nesta página, em Hellspawn #7, temos pelo menos mais duas referências ao personagem – para não termos dúvidas que este Mike Moran realmente é o Miracleman – onde aparece bem destacado a palavra “ATOMIK” (que ao contrário vira “KIMOTA”, a palavra mágica que o transforma no super-herói), além da piada ao “Palácio de Buckingham”, que não por coincidência é o sobrenome do artista da fase Neil Gaiman em Miracleman, o artista Mark Buckingham!
Capa variante da edição Hellspawn #13 com Miracleman na capa, porém nunca usada antes. Na capa há o texto “A Hero’s Return”, desenhada por Ashley Wood.
Arte nunca publicada, desenhado por Ashley Wood.
Arte acima colorida por André Luiz “ALSO7”.
Pôster distribuído na época, desenhado por Todd McFarlane e Ashley Wood, apresentando Spawn e Miracleman existindo no mesmo universo.
O Man of Miracles é uma continuação espiritual do que foi um dia o Miracleman… Ele surgiu durante o arco da Saga do Armagedom (números 150 até 164).

O julgamento de Tony Twist foi o começo de um longo, longo período de incertezas para Todd McFarlane e quase acabou com tudo que ele veio construindo, até então, por tantos anos… Em um de seus piores momentos, McFarlane lutava para salvar suas empresas, seus personagens e só estava focado em sobreviver a isso tudo. Para se ter uma ideia, a Todd McFarlane Productions Inc. era responsável, principalmente, pela criação das revistas do universo Spawn e a empresa McFarlane Toys, como o nome já diz, responsável pelos brinquedos, estatuetas e as figuras de ação ultra detalhadas. A empresa foi pioneira neste ramo e abriu os olhos da indústria (talvez um dos maiores legados deixado pelo Todd Father) para esta linha de colecionáveis (onde adultos poderiam gastar uma boa grana em uma verdadeira obra de arte). Sua empresa revolucionou o modo como a indústria produz até hoje action-figures ultra detalhistas, inspirando outras empresas como por exemplo: Neca, Hot Toys, Sideshow Collectibles, e até mesmo a nova empresa brasileira, Iron Studios.

Todd estava enfrentando batalhas judiciais de várias frentes; de pessoas que ele não conhecia pessoalmente (na forma de Tony Twist), para aqueles com quem ele colaborou (na forma de Neil Gaiman) e também em tribunais de falência (na forma da Editora Eclipse e de suas próprias empresas McFarlane Toys e TMP Inc).

Claramente a luta que mais lhe custou, em termos puramente financeiros, foi a que lhe foi imposta por Tony Twist. Levaria anos e milhões de dólares para finalmente se resolver tudo. Como consequência disso nas HQs do Spawn, em todas as revistas que aparecia o nome “Tony Twist” tiveram que substituir por “Vito Gravano” (e isso aconteceu nas republicações das edições, nos encadernados americanos).

Uma das consequências do caso contra o jogador de hóquei Tony Twist foi alterar o nome do personagem mafioso de Spawn para Vito Gravano em todas as republicações de Spawn.

Mas a luta que potencialmente mais atingiu a McFarlane, tanto no pessoal quanto no profissional, foi a travada com Gaiman, pois deu a impressão de que ele se apropriava de personagens criados por Gaiman (Ângela, Spawn Medieval, Cogliostro e Miracleman) sem acertar os devidos pagamentos de direitos autorais e pendências de acordos previamente acordados.

A consequência nos quadrinhos, acerca desses personagens citados acima, após os devidos acertos judiciais, foi que a Ângela nunca mais voltou a aparecer nas histórias do Spawn (hoje em dia, depois que ela morreu na Image Comics, foi recriada na Marvel Comics como uma guardiã cósmica), mas suas histórias antigas podem ser reimpressas. O Spawn Medieval chamado Sir John of York foi reescrito e hoje é um novo personagem… O Conde Nicholas Cogliostro também voltou a ser usado nas histórias, ainda é um personagem importante para a trama e Miracleman saiu das mãos do Todd e hoje em dia está com os direitos reservados à casa das idéias Marvel, depois que o prórprio Neil Gaiman repassou à eles.

Isso tudo que aconteceu, para a indústria de quadrinhos em geral, mostrou uma visão de que Todd McFarlane não era melhor do que as corporações que ele passou anos trabalhando previamente, Marvel e DC Comics, pois como todos já deveriam saber, Todd saiu dessas empresas e co-fundou a Image Comics em 1992, justamente porque um dos motivos era que ele queria ter o controle total dos direitos em cima de seus personagens (livre domínio de criação). Foi daí que surgiu a ideia, meses depois, do roteiro escrito por Dave Sim em Spawn #10, mas explicar sobre esta edição já daria por si só uma matéria a parte.

Levaria ainda mais duas décadas para que McFarlane pudesse se reerguer e ficar livre de todas essas lutas judiciais. Ele saiu arrasado, machucado, enfrentando acusações de hipocrisia (se dizia que ele havia “traído o movimento”) e com um sério golpe em sua reputação, mas ele não estava totalmente derrotado. Apesar daqueles que desejavam ver sua desgraça, Todd McFarlane conseguiu se reerguer relativamente intacto!

E toda esta história descrita neste artigo, contando um pouco dessas “tretas” do mundo contra McFarlane, foi apenas para mostrar à vocês que TODOS estes detalhes, e muito mais, estão presentes no livro chamado “The World vs Todd McFarlane”, escrito por Daniel Best – ainda inédito no Brasil.

E agora, pela primeira vez em muito tempo, você poderá ler todas estas histórias das épicas batalhas legais e judiciais, desferidas contra o mestre Todd McFarlane, neste incrível livro chamado “The World vs Todd McFarlane” (em tradução livre seria algo como “O Mundo Contra Todd McFarlane”).

Todo o conteúdo deste livro foi tirado diretamente de documentos judiciais, entrevistas, artigos e muito mais. É realmente um trabalho incrível de investigação feita por Daniel Best. Ele publicou este conteúdo em vários capítulos através do seu blog pessoal. Você pode conferir a primeira parte através deste link.

“The World vs Todd McFarlane”, está disponível em inglês na Amazon.

Todd brincando com a situação
antes mesmo da “treta” toda
começar com Neil Gaiman.

Referência:

https://ohdannyboy.blogspot.com/2019/05/the-world-vs-todd-mcfarlane-available.html

https://ohdannyboy.blogspot.com/2018/12/the-world-vs-todd-mcfarlane-part-one.html

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